As telecomunicações são ferramentas essenciais para a inovação em todos os setores da economia, e as empresas brasileiras encontram-se num momento em que precisam aumentar sua capacidade de competir no cenário mundial.
Na edição mais recente do Relatório de Competitividade Global, do Fórum Econômico Mundial, o Brasil caiu seis posições e ficou em 81º lugar, num ranking de 140 países. No componente inovação, a colocação do País foi ainda pior (100ª posição).
Melhorar as condições para o investimento em telecomunicações ajudaria as empresas brasileiras dos mais diversos setores a darem um salto de inovação.
Atualmente, existem várias amarras que limitam a atuação das operadoras, principalmente daquelas que trazem competição ao mercado.
Uma medida urgente é a revisão do modelo setorial. Criada há quase 20 anos, a Lei Geral das Telecomunicações (LGT) deve ser reformulada nos próximos meses.
Um projeto em tramitação no Congresso deverá proporcionar um ambiente mais propício ao investimento, principalmente na banda larga.
A LGT foi criada numa época em que a telefonia fixa era o principal serviço, e o acesso à internet era feito por linha discada.
Quando foi promulgada, em 1997, a LGT tinha como um dos principais objetivos universalizar as telecomunicações por meio de telefonia fixa.
As concessionárias de telecomunicações assumiram obrigações de universalização que definiam, entre outras coisas, compromissos de instalação de telefones públicos.
Mas o cenário mudou. Segundo dados da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), em julho deste ano havia 252,6 milhões celulares em operação, comparados a 42,6 milhões de linhas fixas.
A universalização aconteceu por meio da telefonia móvel, que não é alvo de concessão e tem uma carga menor de obrigações.
Assim como o celular, o acesso à internet também não é objeto de concessão, e apresentou um avanço considerado nas duas últimas décadas.
As mudanças na LGT estão sendo discutidas no projeto de lei 3.453/2015, em tramitação na Câmara dos Deputados.
A principal questão tratada pelo projeto é a possibilidade de converter as atuais concessões de telefonia fixa (detidas pela Telefônica Vivo, Oi, Embratel, Algar Telecom e Sercomtel) em autorizações.
E, nessa questão, o destaque é a reversibilidade dos bens essenciais à prestação do serviço de telefonia fixa.
Em 2025, quando terminam as atuais concessões, esses bens teriam de ser devolvidos à União. Mas, com a convergência de meios, uma mesma infraestrutura acaba sendo usada para a prestação de vários serviços. A rede óptica, por exemplo, transporta sinais de televisão, telefonia fixa e móvel e banda larga.
O projeto prevê uma avaliação proporcional desses ativos compartilhados, e a conversão desse valor em compromissos de investimento em infraestrutura de banda larga.
Menos incerteza
Divino Sebastião de Souza, vice-presidente de Operações do Grupo Algar, acredita que a mudança vai acabar com incertezas que dificultam o investimento.
“A LGT não evoluiu com as tecnologias e com o próprio comportamento do consumidor”, explica Souza. “Além disso, a insegurança jurídica causada pelo sistema de concessão impede que o investidor arrojado faça aplicações ousadas. Em telecomunicações, o retorno do investimento acontece, no mínimo, em 10 anos. Quem vai querer investir sem saber se terá tempo para o retorno?”
Especializada em direito das telecomunicações, a advogada Silvia Melchior destaca que o projeto traz poucas mudanças estruturais na lei.
“Não está em debate na Câmara o modelo criado pela LGT”, explica a especialista. “Até porque, se tem uma coisa em que a LGT acertou foi criar todo o processo de competição, por exemplo.”
As alterações da lei devem priorizar a competição. Há uma tendência natural de consolidação e é necessário criar condições para que surjam novas empresas, com condições efetivas de concorrer pelo mercado. Isso também deve ser prioridade da Anatel.
Para Chris Torto, presidente da Ascenty, a situação atual das telecomunicações no País é uma prova de que o modelo atual não está funcionando.
“Temos menos concorrência, os preços pararam de cair e os clientes reclamam da qualidade”, afirma o executivo. “É importante reduzir a burocracia e incentivar o surgimento de novos entrantes.”
A troca de obrigações das concessionárias por investimentos não pode criar condições competitivas privilegiadas para as empresas dominantes, que já contam com vantagens naturais de escala.
Mais investimento
Tiago Brocado Machado, gerente de estratégias da Ericsson na América Latina, acredita que o momento é propício para incentivar investimentos em internet.
“É preciso introduzir na agenda novos tópicos e sair da discussão do serviço de voz”, afirma Machado. “A revisão do marco legal aponta para o fomento da banda larga.”
A expectativa é que a conversão do valor dos bens reversíveis em instalação de redes de dados e a assinatura de termos de ajustamento de conduta com a Anatel (conversão de multas em compromissos de expansão) façam com que os investimentos do setor voltem a crescer.
“A revisão do modelo é uma agenda para o país”, afirma Gustavo Gachineiro, vice-presidente de assuntos corporativos da Telefônica Vivo. “Falta sustentabilidade ao atual modelo de concessão, e a questão dos bens reversíveis é um risco jurídico.”
O mercado tem pressa na revisão da LGT. Apesar disso, Luiz Carlos Delorme Prado, professor do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), defende mais discussão sobre o tema.
“Defendo que seja feito uma série de estudos de impactos regulatórios”, afirma Prado. “E audiências públicas com especialistas no setor também são bem-vindas antes de aprovar o projeto.”
O Brasil enfrenta o grande desafio de retomar a competitividade e incentivar a inovação. A expansão da banda larga com qualidade é essencial para cumprir essa tarefa.
- Esta é a primeira de uma série de cinco reportagens sobre telecomunicações e inovação, publicadas às quintas-feiras pelo inova.jor. As opiniões expressas nas reportagens não refletem necessariamente a posição da Associação Brasileira das Prestadoras de Serviços de Telecomunicações Competitivas (TelComp).