Um tributo a Clayton Christensen, pai da inovação corporativa

Clayton Christensen morreu em 23 de janeiro / Betsy Weber
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Clayton Christensen morreu em 23 de janeiro / Betsy Weber
Clayton Christensen morreu em 23 de janeiro / Betsy Weber

O senso comum trata como teórico quem é pouco prático. Uma inadequação conceitual.

Médicos tomam decisões práticas sobre quais remédios prescrevem a seus pacientes com base em teorias.

Engenheiros constroem pontes a partir de teorias.

O conhecimento codificado, científico, ainda é a forma mais eficaz de lidar com os desafios nos variados campos de atuação.

Não existe nada mais prático do que uma boa teoria.

Isaac Newton, um dos principais cientistas e teóricos de todos os tempos, considerado o pai da física moderna, descobriu a lei da gravidade universal.

Freud, tido por muitos como o pai da psicanálise, começou a estudar a utilização da hipnose no tratamento de pacientes com histeria.

O avanço do conhecimento ocorre por meio de ideias ousadas de pesquisadores curiosos e corajosos em questionar, testar e provar que o conhecimento estabelecido, por vezes, não explica mais determinados fenômenos.

Não seria demasiado definir que Clayton Christensen, falecido em 23 de janeiro, é o pai da inovação corporativa.

Se você não é um empreendedor ou inovador corporativo é possível que não o conheça, mas, sem dúvida, já ouviu falar de suas ideias.

O dilema da inovação

Maximiliano Carlomagno, da Innoscience / Divulgação
Maximiliano Carlomagno, da Innoscience / Divulgação

Ele é o criador da teoria da inovação disruptiva que redefiniu o entendimento de executivos sobre as causas do fracasso de empresas estabelecidas.

Conheci seu trabalho em 1999, poucos anos depois da publicação de seu mais renomado livro: O dilema da inovação.

Na obra, Clay explica como grandes empresas estabelecidas se arriscam ao fracasso ao serem bem gerenciadas.

A teoria de Christensen redimensionou a inovação em empresas estabelecidas.

A partir de uma pesquisa na indústria de disco rígido americana, Christensen estabeleceu a teoria sobre a qual as empresas, ao focarem em melhorar resultados e atenderem seus melhores e mais sofisticados clientes acabam ignorando oportunidades de aproveitar necessidades de clientes menos demandantes que podem se transformar em mercados atraentes.

Nesse cenário, segundo Christensen, novos entrantes que oferecem soluções mais simples e convenientes (inovações disruptivas) começam atacando os clientes deixados para trás pelos líderes.

Como não se sentem atacados, os executivos não reagem aos novos players, que vão melhorando suas inovações e, ao longo do tempo, começam a atacar os clientes dos líderes.

Esses, por sua vez, quando percebem, já são suplantados pelos inovadores — ou na linguagem da teoria, são disruptados.

Ainda segundo a teoria, para evitar o processo de disrupção, as empresas estabelecidas deveriam criar unidades separadas para tratar da inovação.

Diferentes dimensões da inovação

O professor da Harvard Business School foi eleito o maior pensador da gestão pela Thinkers50 por duas oportunidades e recebeu prêmios de melhor artigo do ano da Harvard Business Review

Christensen era hipnotizante. Era impossível perder a atenção ao escutar a voz calma e as ideias meticulosamente apresentadas seja numa sala de aula, um curso online ou entrevista para um podcast. 

O livro que o tornou reconhecido foi baseado no artigo publicado em 1995, escrito com Joseph Bower, “Disruptive technologies: catching the wave“.

Ao longo de mais de 20 anos de publicações, as teorias de Christensen abordaram diferentes dimensões da inovação corporativa.

A Harvard Business Review compartilhou recentemente uma imperdível coletânea com o essencial de suas ideias.

Tive a oportunidade de utilizar e aplicar as teorias de Christensen na área acadêmica, baseando minha dissertação de mestrado em suas ideias e como professor.

Também, usando suas teorias e frameworks em projetos de consultoria.

Como um tributo ao mestre pensei em compartilhar meu entendimento de como e quando algumas de suas principais teorias podem ser utilizadas para tratar a inovação de forma sistemática e eficaz no seu dia a dia.

Para Christensen, as boas teorias são especificas e circunstanciais.

Organismos vivos que precisam ser continuamente testados e refinados. Suas teorias ensinam não apenas o que pensar mas, especialmente, como pensar.

Nada mais importante do que saber quando usar qual teoria.

Responder à disrupção

Se você trabalha numa grande empresa, líder em seu setor, mas percebe que os melhores clientes não pagam mais por suas inovações incrementais e surgem novos concorrentes com produtos aparentemente inferiores, a teoria a ser dissecada é a da disrupção.

As indústrias se transformam, em determinadas circunstâncias, por um processo de entrada de novos players com soluções mais baratas, simples e convenientes desmotivando a resposta dos líderes até que tomam seu espaço.

Nessa teoria você poderá ter acesso a prescrições sobre como antecipar esse processo e responder a disrupção com maior chances de sucesso.

Definição de estratégia de inovação

Se o seu objetivo é desenhar uma estratégia de inovação, é preciso definir o foco de seu budget e recursos para um determinado portfólio de projetos.

Uma boa parcela do fracasso da inovação reside no desalinhamento da alta gestão sobre que tipo de inovações priorizar.

Para tanto, você pode utilizar o framework de três tipos de inovação – disruptiva, sustentada e de eficiência.

Desenvolvimento de produtos inovadores

Se o seu desafio é desenvolver produtos e serviços inovadores, recomendo a teoria do job to be done.

O processo de desenvolvimento de novos produtos tem sido altamente randômico e ineficiente.

A teoria do job to be done é útil para entender o comportamento de seu potencial consumidor, o racional de suas decisões de compra e as dores e benefícios esperados.

O job to be done é, segundo Christensen, a situação problema para o qual os clientes selecionam determinados produtos ao invés de outros e constitui a correta unidade de análise ao invés do perfil dos consumidores, normalmente priorizados pelo marketing.

Design organizacional para inovação

Se você quer saber qual o melhor design organizacional para um projeto inovador dentro de uma grande empresa, sugiro o framework publicado no livro Innovator’s Solution, que determina em quais situações a empresa deve optar por separar a iniciativa inovadora da empresa mãe e quando deve ser um time multidisciplinar dentro da empresa estabelecida.

Nem sempre separar é a melhor opção.

Avaliar teorias e ferramentas de gestão

Se a sua necessidade como executivo é selecionar o melhor conhecimento disponível para apoiá-lo em determinado desafio do negócio, recomendo firmemente o artigo Why hard nosed executives should care about management theory”. 

Christensen detalha como são elaboradas as melhores teorias de gestão. É um conteúdo extremamente útil para separar o joio do trigo.

Teórico é o pesquisador que codifica, a partir da observação, um conjunto de proposições sobre como lidar com determinada situação. Não há nada mais prático do que uma boa teoria, feita com paixão e disciplina como Christensen fez.

Conhecer sua teoria pode ser muito interessante. Saber quais devem ser aplicadas em quais circunstâncias pode ser decisivo.

Essa é uma das mais poderosas e práticas ideias deixada pelo pai da inovação corporativa.


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